Hoje em dia quando vejo em diversas oportunidades, situações como as que o Prof. Rafael Chiuzi comenta em seu artigo que tomo a liberdade de reproduzir a seguir, fico pensando: Onde vamos parar?
Em todos os locais, em todos os meios e em todas as redes sociais nos deparamos com termos e comentários agressivos e apelativos, parece que todos têm o direito de agredir, de desacatar, de massacrar o adversário, ou aquele que apenas não concorda com suas posições, a troco de quase nada, ou de uma simples "valorização pessoal".
Repito a pergunta que fiz logo acima: Onde vamos parar? Há alguns dias, numa rede social , me referi a este mesmo assunto fazendo reflexões sobre o comportamento das pessoas hoje em dia e escrevi o seguinte:
- Sou do tempo de se parar em sinal vermelho, ser gentil com mulheres, ser cortês com as pessoas, dirigir sem falar ao celular, não estacionar em vagas de deficientes, não sentar em bancos de idosos e grávidas nos ônibus, de mães não agredirem professores porque estavam querendo corrigir seus filhos, em que todos faziam as refeições juntos, em que as televisões eram desligadas quando chegavam visitas, de não passar na frente dos outros na filas de supermercados para mostrar aos filhos que se é esperto, de se estacionar em filas duplas em local proibido nas portas de escolas para se buscar filhos, e, enfim acho que sou de um outro mundo...
E, assim as pessoas vão vivendo, de forma agressiva, arrogante e mal-educada, só porque "somos assim mesmo"...
Vamos então ao...
Artigo do Prof. Rafael Chiuzi
19 de Abril de 2012.
A
era do “barraco”
Vivemos em uma época
no mínimo peculiar. Apelidei-a de “era do barraco”, pois talvez seja onde a
inversão de valores sociais esteja mais explícita hoje. Curioso hoje como
muitas pessoas aquilatam expressões cotidianas como “fiz
o maior barraco” ou “desci das
tamancas” ou ainda “mostrei
as garras” etc. No começo o alvo dos comportamentos
agressivos eram majoritariamente operadores de teleatendimento,
progressivamente isso começou a se espalhar: vendedores, atendentes,
balconistas, secretárias, porteiros, professores e, para meu espanto, hoje
percebo tal moda tomou ares de um ethos generalizado a quase todos os seres humanos. Tanto em suas vidas
pessoais quanto nas próprias organizações.
Certas pessoas se orgulham de relatar como “fizeram
um barraco” se contentando unicamente com a racionalização
de que “sou assim mesmo viu, não adianta porque
sou barraqueiro (a)” sentindo-se praticamente desculpados por si
mesmos permitindo-se adotar comportamentos bestiais que, nem de perto, são
ideais para a convivência com outros seres humanos. A balconista da padaria lhe
deu o lanche com aquele tomate que você havia pedido para ser retirado? Que absurdo!
Acabe com ela para mostrar quem manda! Não deixe barato!
Quem manda em que? onde? E por quê? Esses seres realmente
se veem no direito de agredir pessoas verbalmente, de forma escrita ou falada, para
mostrar sua superioridade? Você crê em seus direitos, mas não respeita o direito
dos outros? E estranho como tem certeza de que “saiu
por cima”, mais uma expressão que me intriga. Que época mais
estranha.
Estranha porque “descer
das tamancas” ou “fazer um fuá” virou sinônimo de estabelecimento de defesa própria, virou sinônimo de
poder (ainda que ilusório). E talvez a pior parte seja a de que esse discurso, assim
como a prática de bestializar outras pessoas é estimada por outras pessoas, que
avaliam dizendo “isso mesmo, fez muito bem... eu mesma uma vez
peguei de jeito uma secretária e bla bla bla”, e também contam
suas peripécias mal educadas de como “saíram por cima
de outra pessoa”. Fico pensando em como educar meu filho hoje em
um mundo onde isso é valorizado, mais do que valores que edificaram nossa sociedade
como honestidade, ética e, acima de tudo, humildade para com o próximo. Fico pensando
como vivemos na era também do “Respeite meus direitos, mas esqueça meus deveres”,
onde destratar um garçom, por exemplo, é normal e pior: justificável.
Nunca me esqueço de quando ainda era apenas um estagiário
de psicologia na UTI de uma Santa Casa no interior do Estado de São Paulo, onde
atendia pacientes internados em terapia intensiva, e vez ou outra seus familiares
também. Um dos senhores de uns 60 e poucos anos que atendi certa vez, em situação
muito grave de saúde, me disse em uma terça feira à tarde, bastante chuvosa (difícil
de esquecer) com o olhar muito triste e arrependido: “Sabe,
agora que sei que estou morrendo e ninguém veio me visitar aqui nem mesmo na UTI,
eu penso que, na minha vida, deveria ter tratado melhor as pessoas que passaram
por mim”. Mesmo jovem entendi que aquele deveria ser um ensinamento
que deveria carregar por toda a minha vida.
Por isso hoje quando testemunho uma pessoa tratando
outra com tal desprezo, penso se verdadeiramente podem ser analisadas como seres
pensantes, racionais, sensatas, ou se deveriam receber o mesmo tratamento que apresentam
aos outros, mas logo depois a realidade me chuta na cabeça me advertindo que talvez
se elas receberem o mesmo tratamento – aí sim terão um ponto basal para continuar
fazendo o que já fazem – ou seja, a visão de que o mundo está contra ela e que ela
deve se acastelar a todo momento, atacando para não ser atacada, “mostrando
quem manda” e que “comigo não se brinca” (mais uma expressão intrigante).
Assim, me pergunto por que na atualidade torna--‐se
tarefa tão árdua tratar as pessoas bem? Quais são os empecilhos de se assentar empaticamente
no lugar do outro? Por que as pessoas tem visto o outro mais como inimigo do que
como um semelhante? Talvez sejam muitas indagações para respostas ainda escassas.
O irônico é que algumas, essas que se orgulham de
“fazer barraco” talvez lerão esta reflexão e dirão a si mesmas: “isso
mesmo, tem que tratar as pessoas com respeito, por isso que eu faço isso todos os
dias” e daqui a um par de horas estarão repetindo seu
padrão acéfalo com outra pessoa, pelo computador, presencialmente, ou em qualquer
outra interação humana de sua vida, seja em seu lar ou em seu trabalho.
Enquanto isso nos resta esperar que a era do barraco
seja passageira e que possa se configurar como mais um modismo da vida moderna,
onde tantas outras coisas são mais importantes e valorizadas do que ser um bom cidadão,
onde respeitar o outro é sinônimo de “coisa para os fracos”.
Rafael Chiuzi.
Psicólogo, Doutorando em Psicologia Social.
Prof. Da Universidade Metodista de São Paulo
Acho que precisamos, todos, repensarmos nossa postura no dia-a-dia, não agora, mas já a partir de ontem...
Bom final de semana a todos os leitores,
Eli dos Reis.
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